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É devido o imposto sobre herança de Silvio Santos nas Bahamas?

  • Foto do escritor: patriciamalteca
    patriciamalteca
  • 10 de jan.
  • 4 min de leitura

Entenda a incidência de ITCMD sobre valores no exterior



As herdeiras de Silvio Santos - a viúva, Iris Abravanel, e suas filhas Patrícia, Rebeca, Cintia, Silvia, Daniela, e Renata Abravanel - moveram uma ação judicial buscando afastar o pagamento de R$ 17 milhões em ITCMD, imposto que incide sobre uma herança estimada em R$ 429,9 milhões.


A controvérsia gira em torno de ativos mantidos em contas no exterior, com a maior parte situada em uma instituição financeira nas Bahamas, o Daparris Corp Ltd, onde Silvio Santos era o principal acionista.


A família argumenta que, por serem fundos mantidos em uma jurisdição estrangeira, não se aplicaria a legislação tributária brasileira.


O Estado de SP, por sua vez, representado pelo procurador Paulo Gonçalves da Costa Júnior, defende a aplicação do imposto. 


Inicialmente, o caso foi mantido em segredo de Justiça, mas o juiz de Direito Márcio Ferraz Nunes, da 16ª vara da Fazenda Pública Central de SP, negou o pedido de sigilo das herdeiras, que alegavam preocupação com o interesse midiático.


De fato, a questão sobre a incidência do imposto em valores no exterior é controversa, mas já foi discutida no Supremo. Entenda.


O imposto é devido? 


Na avaliação do tributarista Rodrigo Massud (Choaib, Paiva e Justo Advogados Associados), o pleito das herdeiras é legítimo, e não deve incidir o imposto sobre os bens no exterior.


O advogado explica que o STF já se debruçou sobre a matéria, e que existe na Constituição uma previsão de que, em situações de sucessão, o ITCMD relativo a bens situados no exterior dependeria de uma lei complementar nacional para que os Estados pudessem instituir e exigir a cobrança, por uma simples razão de competência federativo: a que Estado competiria cobrar?


Esta lei complementar, por sua vez, não existe.


Os Estados legislaram sobre isso, e passaram a prever a cobrança do imposto mesmo sobre bens no exterior. A questão foi, assim, levada ao Supremo.


Em 2020, o STF julgou o tema 825, reconhecendo a inconstitucionalidade das leis estaduais com a referida cobrança. Foi fixada a seguinte tese para fins de repercussão geral:


"É vedado aos estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no art. 155, § 1º, III, da Constituição Federal sem a intervenção da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional."


O problema, segundo o advogado, é que os Estados continuam realizando a cobrança, levando os contribuintes a buscarem o Judiciário - como é o caso das herdeiras de Silvio Santos.


Massud pontua que houve uma tentativa de modificação da questão, em uma regulamentação provisória na EC 132, de dezembro de 2023, mas segundo o advogado o texto não foi incorporado às legislações locais e não teve eficácia.


Atualmente, está em tramitação no Congresso a proposta de lei complementar 108, da reforma do consumo, que dispõe sobre o tema. O advogado acredita que, aprovado o PLP, aí sim os Estados terão de incorporar e respeitar a anterioridade anual e nonagesimal para, então, cobrar o ITCMD nesses casos.


Questão jurídica


Os tributaristas Susy Gomes Hoffmann e Gustavo Carrile da Silva observam que a lei complementar exigida pela Constituição ainda não foi aprovada, de modo que continua vigente a regra de transição trazida pela EC 132.


Para eles, a discussão jurídica que existe no momento reside em saber se, a partir desta emenda, que dividiu as competências dos Estados para tributar transmissões de heranças e doações no exterior, as leis estaduais aprovadas anteriores a ela podem ser usadas como fundamento para que os Estados cobrem o ITCMD sobre tais transmissões.


"Em outras palavras, uma lei estadual declarada inconstitucional pelo STF pode voltar a ter validade pelo simples fato de a Emenda Constitucional 132 ter disciplinado a matéria? Ou será que a lei estadual declarada inconstitucional deveria ser totalmente extirpada do ordenamento e, para poder cobrar, os Estados devem aprovar novas leis estaduais após a vigência da emenda constitucional 132?", questionam os advogados.


Eles observaram que debate semelhante ocorreu no fim da década de 90 e começo dos anos 2000, quando um trecho da lei 9.718/98 cobrava PIS e Cofins sobre outras receitas sem fundamento constitucional.


O STF decidiu que, mesmo tendo havido emenda constitucional posterior permitindo a incidência de PIS e Cofins sobre outras receitas, a lei anterior a ela não poderia ser convalidada e a cobrança dessas contribuições dependia de nova legislação aprovada após a emenda constitucional.


Resta saber qual será o posicionamento do Poder Judiciário nesse tema envolvendo a cobrança de ITCMD sobre herança de bens mantidos no exterior após a EC 132. O debate ainda é recente.


Na opinião dos tributaristas, assim como no caso do PIS/Cofins, "as leis estaduais que exigiam ITCMD sobre herança de ativos no exterior declaradas inconstitucionais não foram convalidadas pela EC 132, pois já nasceram inconstitucionais e nunca deveriam ter produzido efeitos". Assim, entendem que os Estados devem editar novas leis para poder efetuar a cobrança nas situações de transmissão de patrimônio situado fora do Brasil. "De toda forma, será preciso aguardar o desenrolar dos casos e o posicionamento dos tribunais."


Exigência do Estado de SP


A tributarista Lina Santin Cooke explica o que dispõe a lei paulista 10.705/00 em seu artigo 4ª:


Artigo 4º - O imposto é devido nas hipóteses abaixo especificadas, sempre que o doador residir ou tiver domicílio no exterior, e, no caso de morte, se o "de cujus" possuía bens, era residente ou teve seu inventário processado fora do país:


I - sendo corpóreo o bem transmitido:


a) quando se encontrar no território do Estado;


b) quando se encontrar no exterior e o herdeiro, legatário ou donatário tiver domicílio neste Estado;


Diante desta previsão, o Estado de São Paulo vem exigindo o ITCMD.


Mas, em recente decisão, a 3ª câmara de Direito Público do TJ/SP entendeu que, considerando a inexistência de lei complementar, é vedado ao Estado paulista exigir o imposto (processo 1047533-70.2023.8.26.0053).


Assim, a advogada também entende que, até o momento, o ITCMD não pode ser cobrado.


No entanto, Lina observa que o TIT - Tribunal de Impostos e Taxas proferiu entendimento de que "na ausência da lei geral, os Estados possuem competência plena para legislar sobre o imposto, inclusive sobre a sua incidência em relação aos bens imóveis situados no exterior" (AIIM nº 4.068.013-7, Câmara Superior, voto da Relatora do Recurso Especial, Dra. Cacilda Peixoto).


Além disso, foi exarado o entendimento no voto-vista de Alberto Podgaec de que os efeitos do tema 825 do STF aplicam-se a ações judiciais em curso, e não a processos administrativos. "Nesse contexto, a discussão judicial é a melhor alternativa", conclui a advogada.







 
 
 

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